São Paulo, a Terra da Garoa. Uma cidade vibrante, cheia de histórias, mas poucas delas são tão marcantes quanto a do bairro do Jaçanã. E se falamos de Jaçanã, não há como não lembrar de um de seus maiores ícones: Adoniran Barbosa.
Nascido João Rubinato, filho de imigrantes italianos, Adoniran cresceu em meio à diversidade paulistana. Achava que seu nome de batismo não combinava com o samba, então se reinventou. Pegou “Adoniran” emprestado de um amigo e adotou “Barbosa” em homenagem ao sambista Luiz Barbosa. Assim, surgiu um dos maiores nomes da música brasileira.
Mas sua caminhada não foi fácil. Com uma voz fanha e um jeito peculiar de cantar, foi desclassificado inúmeras vezes antes de conquistar seu espaço. Em 1933, venceu um concurso cantando Filosofia, de Noel Rosa. Pouco tempo depois, em 1935, compôs sua primeira música, Dona Boa, vencedora do Carnaval de São Paulo daquele ano.
O Sotaque da Pauliceia
O diferencial de Adoniran estava em sua forma única de compor. Ele não se preocupava com gramática ou normas, preferia retratar a fala popular da cidade. Isso rendeu críticas, até mesmo de Vinicius de Moraes, mas também fez dele um cronista da São Paulo real. Seus sambas eram pequenas histórias do cotidiano, cheias de humor e melancolia, com personagens icônicos como o malandro Zé Cunversa e Jean Rubinet, um falso galã francês.
Foi com Osvaldo Moles que nasceram clássicos como Tiro ao Álvaro e Pafúncia. E claro, sua parceria mais memorável foi com os Demônios da Garoa, que imortalizaram suas músicas, levando-as para todo o Brasil.
O Trem das Onze
Entre tantos sucessos, um deles se tornou a cara de São Paulo: Trem das Onze. O curioso é que o trem realmente existiu! Criado em 1894 para levar água da Cantareira ao centro da cidade, virou meio de transporte popular. Mas em 1965, no ano seguinte ao sucesso da música, ele foi desativado.
Meu avô, que trabalhou perto da estação, conheceu Adoniran nos tempos de rádio Cruzeiro do Sul e sempre contava uma história engraçada. Um dia, depois de ganhar no jogo do bicho, Adoniran resolveu se vestir à altura e comprou tecido de casimira para fazer dois ternos, um para ele e outro para meu avô. Naquela noite, saíram para um clube e foram surpreendidos por um pé d’água. Quando chegaram em casa, os ternos haviam desbotado e as camisas estavam completamente verdes! Meu avô nunca esquecia esse dia e ria toda vez que contava.
O Adeus ao Poeta
Adoniran viveu intensamente, mas seus últimos anos foram marcados por tristeza. A cidade que ele tanto amava mudou, e ele se sentiu esquecido. Boêmio, com mesa cativa no Bar Brahma, partiu em 23 de novembro de 1982, deixando um legado eterno.
Para homenageá-lo, basta ouvir suas músicas e se deixar levar pelas histórias de uma São Paulo que talvez não exista mais, mas que vive para sempre no ritmo do seu samba.